A VELHA LOJA DE CURIOSIDADES

Claudia Figueyra


No meio de Londres, aquele era o ano de 199..., a senhora Wilson estava surpresa em ver bem α sua frente, na mesma esquina, a ôVelha Loja de Curiosidadesö, o tπo falado lugar que avidamente procurara em suas duas ·ltimas viagens α cidade. Nunca tinha conseguido encontrß-lo, embora sempre tenha seguido rigorosamente as indicaτ⌡es do mapa. Mas lß, naquele preciso momento em que encontrava a loja, parecia que uma nuvem tinha sumido dos seus olhos - ou seria aquilo uma espΘcie de miragem? A ôVelha Loja de Curiosidadesö, lß estava ela. Encontraria ali as aventuras, os mistΘrios de Londres com os quais havia sonhado?
O lugar parecia insignificante comparado αs outras casas do quarteirπo. Mas, ôoraö, disse para si , ôhß certamente mais coisas entre a aparΩncia e o interior do que sonha a nossa filosofia.ö E a senhora Wilson entrou na loja abrindo cerimoniosa a porta que rangia.
Estranho como possa parecer, nada ali era de fato antiguidade ou aguτaria a curiosidade de ninguΘm. A senhora Wilson tinha ficado bastante desapontada e estava a ponto de ir embora quando um homem veio em sua direτπo.
ôPerturbo, senhora?ö, perguntou o homem.
ôNπo, de modo algum.ö
ôDeixe eu me apresentar, John Merlin.ö
ôSara Wilson. O senhor trabalha aqui?ö
ôNπo, na verdade eu sou o dono do lugar.ö
ôAh, sim.ö
ôEncontrou alguma coisa que lhe interessasse?ö
ôNπo, nπo, desculpe.ö
ôPor quΩ?ö
ôPensei que encontraria aqui algumas maravilhosas e diferentes pequenas peτas, mas devo dizer, senhor, jß que perguntou, que nada aqui desperta curiosidade.ö
Diante de tais palavras, o Sr. Merlin ficou estarrecido e parou com o isqueiro na mπo direita e um cigarro pendurado na boca.
ôPeτo desculpas se pareci um tanto ou quanto rudeö, disse ela.
ôConfesso,ö disse o senhor Merlin,öter me surpreendido com a sua sinceridade. De fato nunca tinha encontrado ninguΘm que ousasse me dizer a verdade sobre esta loja. Tudo o que estß α mostra Θ um monte de porcaria, a senhora tem toda razπo. Mas se puder me acompanhar, senhora...ö
ôWilson, Sara Wilson.ö
ôAh, sim, senhora Wilson. Se puder me acompanhar ao quarto de trßs, tenho certeza que esta ôvelha lojaö nπo irß desapontß-la.ö
E cruzando o corredor, entraram em um estranho aposento coberto de velas. Um armßrio escuro era a ·nica peτa de mobilißrio. Do bolso do palet≤, Merlin retirou uma chave de ouro na qual estava encravado o n·mero 666. Sara Wilson tremeu ao reconhecer naquele o n·mero que a numerologia atribuia ao diabo.
ôNeste armßrio, senhora Wilson, estπo guardadas as mais preciosas e requintadas garrafas que o homem foi capaz de criar em sua longa vida. Dentro de cada uma hß raros licores que podem trazer α tona desejos secretos, fantasias, ansiedades ou medos que se encerram no interior mais profundo da alma daqueles que os bebem .ö
Ele abriu o armßrio e uma forte luz cegou a senhora Wilson por um ou dois segundos. Quando seus olhos voltaram ao normal, mirou as garrafas e abriu um largo sorriso. Ela nunca poderia imaginar existisse na face da Terra tπo magnφfica coleτπo de garrafas. Merlin tomou em suas mπos a preta, feita de puro ⌠nix com encrustaτ⌡es em ouro.
ôAgora, senhora Wilson, a senhora Θ uma mulher de coragem. Mas teria coragem suficiente para provar um destes licores?ö
ôNπoö, teria dito ela, mas foi tarde demais.
ôSimö, disse Sara abruptamente.
Devagar, Merlin derramou o lφquido em pequenφssimo cßlice de cristal. Parecia mais com sangue coagulado que com licor. Merlin entregou o cßlice α mulher que, tremendo, fechou os olhos e bebeu.
Quando abriu os olhos, tudo estava exatamente do mesmo jeito. O senhor Merlin trancou o armßrio, despediram-se e ela partiu. Do lado de fora, o tempo estava mudado. Nuvens negras, neblina e vento. A senhora Wilson comeτou a descer a rua tirando o guarda-chuva da bolsa.
Quinze minutos haviam passado e ela ainda nπo tinha chegado ao ponto de ⌠nibus que parecia tπo perto. Sara olhou aqui e ali, mas ninguΘm mais andava sobre as ruas. Ela continuou. Logo escutou passos atrßs de si e, preocupada, virou o rosto para ver. NinguΘm. Voltando a caminhar, os passos voltaram atrßs dela. Assustada, comeτou a correr naquela rua infinita e os passos correram atrßs dela. Lembrou-se das hist≤rias sobre Jack, o estripador, e, desesperada, dobrou α direita, mas, sem sorte, era um beco sem saφda. Correu atΘ o final da rua, encostou-se α murada e esperou. Entπo, a sombra de um homem de capa escura cruzou a luz do poste e veio em sua direτπo. Do interior mais profundo cresceu forte e mais forte um grito e ela berrou estridentemente.
ôSenhora Wilson! Senhora Wilson!ö Segurou-a o senhor Merlin.
ôOh!ö Ela exclamou em terror, acordando.
ôEstß tudo bem, fique calma!ö
ôOnde estou?ö
ôNa ôVelha Loja de Curiosidadesö, lembra-se?
ôAh, sim...ö ôTalvez o ßlcool tenha sido muito forte, a senhora desmaiou e coloquei-a nesta cadeira.ö
ôOhö, disse ela levantando, algo confusa, ôobrigada, muito obrigada, senhor Merlin, mas tenho que ir. ╔ muito tarde e eu tenho que ir. Adeus, senhor Merlin.ö
ôAdeus, senhora Wilson, prazer em conhecΩ-la!ö Exclamou Merlin, enquanto ela, apressadamente, descia a rua...


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